O recente episódio do Banco PanAmericano, do Grupo Silvio Santos, reascendeu no imaginário nacional a questão da importância de boas práticas de Governança Corporativa. Este tema não é mais novidade no Brasil, mas sempre é bom reavivar o progresso alcançado nesta matéria.

Desde a criação do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC (em 1995) a questão da Governança Corporativa tem evoluído de forma surpreendente no Brasil. Esta evolução coincide com o amadurecimento da economia nacional após a estabilidade econômica conquistada com o Plano Real.  A partir de então, ocorreram movimentos profundos nas empresas nacionais – quantidade recorde de IPOs e emissões de ações, investimentos estrangeiros, fusões e aquisições e internacionalização entre outros. Todos estes movimentos demandam e reforçam a criticidade de uma Governança Corporativa efetiva e bem estruturada, já que em alguns casos a falta de requisitos mínimos de Governança Corporativa impede que algumas empresas consigam tirar melhor proveito deste momento favorável da economia e do mercado de capitais no Brasil.

De forma a colaborar com este processo, o IBGC lançou em 1999 a primeira edição do “Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa”, que nesta primeira versão era focada somente no Conselho de Administração.  O Código conquistou importância, evoluiu e chegou à sua quarta edição, lançada em julho de 2010, a qual pode ser acessada neste link.

Nesta sua quarta versão o Código, logo em sua Introdução, afirma que os princípios e práticas da boa Governança Corporativa se aplicam a qualquer tipo de organização, independente do porte, natureza jurídica ou tipo de controle, e que o mesmo está subdividido em 06 (seis) capítulos:

  • Propriedade (Sócios)
  • Conselho de Administração
  • Gestão
  • Auditoria Independente
  • Conselho Fiscal
  • Conduta e Conflito de Interesses

Os princípios básicos de Governança Corporativa que o IBGC defende são:

  • Transparência

Mais do que a obrigação de informar é o desejo de disponibilizar para as partes interessadas as informações que sejam de seu interesse e não apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. A adequada transparência resulta em um clima de confiança, tanto internamente quanto nas relações da empresa com terceiros. Não deve se restringir ao desempenho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores (inclusive intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que conduzem à criação de valor;

 

  • Equidade

 

Caracteriza-se pelo tratamento justo de todos os sócios e demais partes interessadas (stakeholders). Atitudes ou políticas discriminatórias, sob qualquer pretexto, são totalmente inaceitáveis;

  • Prestação de Contas (accountability)

 

Os agentes de governança devem prestar contas de sua atuação, assumindo integralmente as consequências de seus atos e omissões;

Responsabilidade Corporativa

 

Os agentes de governança devem zelar pela sustentabilidade das organizações, visando à sua longevidade, incorporando considerações de ordem social e ambiental na definição dos negócios e operações.

Apesar de sua importância como referência para melhores práticas de governança corporativa, e apesar de defender que os princípios e práticas da boa governança corporativa se aplicam a qualquer tipo de organização, independente do porte, natureza jurídica ou tipo de controle, o Código do IBGC tem uma natureza eminentemente estática, não levando em consideração importantes aspectos e processos pelos quais as empresas enfrentam quando migram de um estágio de evolução para outro: uma microempresa (ou mesmo a média empresa) não se transforma em grande empresa de “uma hora para outra”, nem tampouco o faz sem custos!

Mesmo que, em princípio, não seja a tarefa de um código como este estabelecer estruturas ou regras de como se chegar às melhores práticas, seus elementos constitutivos servem de referência para uma reflexão sobre como “pavimentar uma trajetória” que leve ao alcance destas melhores práticas de governança corporativa.

Neste espírito, um primeiro tema que pode ser abordado nesta direção seria o do estabelecimento do Conselho de Administração ([1]).  Pelo Código do IBGC, o Conselho de Administração é órgão colegiado encarregado do processo de decisão de uma organização em relação ao seu direcionamento estratégico, é o principal componente do sistema de governança. Seu papel é ser o elo entre a propriedade e a gestão para orientar e supervisionar a relação desta última com as demais partes interessadas. O Conselho recebe poderes dos sócios e presta contas a eles.

Mas o que dizer de empresas, por exemplo, cujos fundadores são os principais proprietários, e são também seus principais executivos, e que, em função do seu crescimento, desejam fazer uma reestruturação corporativa, mas sentem que entre a etapa de paulatinamente se afastarem de suas funções de gestão executiva e aquela etapa de criação do Conselho de Administração (onde os proprietários-gestores passarão a ter um papel mais estratégico), percebem que há ainda um hiato corporativo a ser preenchido?

Ao se observar o Código do IBGC, o leitor constataria que uma reestruturação como a acima citada estaria a cargo do Conselho de Administração e da Diretoria Executiva, sendo o Diretor Presidente o responsável pela gestão da empresa atuando como elo entre a Diretoria e o Conselho de Administração.  O Diretor-Presidente, em conjunto com os outros diretores e demais áreas da companhia, é responsável pela elaboração e implementação de todos os processos operacionais e financeiros, após aprovação do Conselho de Administração. O conceito de segregação de funções deve permear todos os processos.

Mas, e se as empresas (como as exemplificadas acima) têm processos críticos (principalmente em empresas que produzem bens intangíveis, como produtos de software e serviços relacionados) que foram definidos em sua evolução pelos seus proprietários-gestores, os quais não podem ser tão facilmente repassados para um novo Diretor Presidente?

A sugestão indicada aqui neste Informe é a da criação de um Conselho Executivo.  Este Conselho poderia ser responsável pela elaboração e implementação de todos os processos operacionais e financeiros da empresa até o momento que ela estivesse segura de repassar a competência deste Conselho para uma nova Diretoria Executiva, e o momento em que a empresa criasse seu novo Conselho de Administração ([2]).

Exemplos de conselhos executivos como o que é aqui sugerido existem tanto na experiência internacional quanto na nacional. Mas isto é tema para outra newsletter!

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber um pouco mais sobre governança corporativa, fique a vontade para nos contatar.

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[1] Só para que o leitor perceba a importância deste tema no Código do IBGC, o mesmo é o destaque do Capítulo 2 do código, contendo 25 páginas a ele dedicadas; os demais capítulos receberam a seguinte distribuição de páginas/cobertura: Capítulo 3 (Gestão): 4,5 páginas; Capítulo 4 (Auditoria Independente): 2,5 páginas; Capítulo 5 (Conselho Fiscal): 3,5 páginas; Capítulo 6 (Conduta e Conflito de Interesses): 4,5 páginas.

[2] A hipótese de manutenção deste Conselho Executivo, mesmo depois da criação da Diretoria Executiva e do Conselho de Administração, não pode ser descartada!