Em Economia e Administração existem dois conceitos centrais que são muito comentados, mas pouco examinados. O primeiro é o conceito de Fronteira de Possibilidades de Produção – FPP (ou PPF- Production Possibility Frontier, em inglês), largamente referido nos livros-texto de Economia, e o segundo é o de Fronteira de Produtividade – FP (ou PF – Productivity Frontier), primeiramente colocado pelo Prof. Michael Porter, da Harvard University, nos EUA, em 1996.
Na perspectiva econômica, a FPP mostra as opções abertas a um indivíduo, família ou empresa em um mundo que produz dois bens. Por definição, cada ponto numa curva (representando o uso contrastado dos dois bens) é produtivamente eficiente, mas, dada a natureza da demanda do mercado, alguns pontos serão mais lucrativos do que outros. O equilíbrio para uma empresa será a combinação de outputs na FPP que é mais lucrativa.
A FPP tipicamente toma a forma de uma curva como a ilustrada na Figura 1 (com dois bens típicos que são valorados na sociedade: armas e manteiga). Uma economia que está operando na curva FPP é dita ser eficiente, significando que seria impossível produzir mais de um bem sem diminuir a produção do outro bem. Em contraste, se a economia está operando abaixo da curva, é dito estar operando ineficientemente porque ela poderia realocar recursos de forma a produzir mais ambos os bens, ou alguns recursos, tais como trabalho ou capital, que estejam ociosos e possam ser completamente empregados para produzir mais ambos os bens.
Passemos à Fronteira de Produtividade - FP. A reflexão sobre este conceito parte do Prof. Michael Porter. Ele concluiu num célebre artigo, intitulado “What is Strategy” (Harvard Business Review, 1996), que diferentes estratégias das empresas são definidas pelos trade-offs no desempenho das atividades que definem o valor criado por um modelo de negócio. Ele ilustra esse framework usando duas dimensões do valor para os consumidores: a) preço e b) não-preço (valor não-preço é um vetor de todas as diferentes dimensões de desempenho que os consumidores desejam. Por exemplo, no caso de automóveis, estas dimensões podem ser segurança, aceleração, estilo, e por aí vai).
Entregar qualquer cesta de benefícios não-preço sempre se incorre em custo. O custo mínimo requerido para atingir um valor não-preço não é um ideal platônico fixo: ele é qualquer custo incorrido pelo provedor de menor custo no mercado. De forma semelhante, o nível de qualquer valor não-preço que pode ser provido a qualquer custo tem um máximo: não importando o que você esteja desejando pagar, você não pode ter um carro que vá de 0 a 60 km/hora em 2.8 segundos, e consumir 75 milhas por galão na cidade. Os limites do que pode ser ofertado, e, a que custo, descreve a “fronteira de produtividade” para o modelo de negócio a um ponto no tempo.
Na Figura 2 temos dois tipos de bens do setor de TICs contrastados. De um lado, temos os sistemas de baixo valor, tais como aqueles popularizados pelos termos “big ball of mud” (*) e “worse is better” (**). De outro lado, temos os bons e complexos sistemas de alto valor. Na figura se vê que num dos extremos temos o ponto 1, onde uma empresa pode parecer quebrar os trade-offs e entregar maior valor não-preço sem um aumento em custo; isto é, ela pode se mover “para a direita” para o ponto 2 (um aumento no valor não-preço) sem se mover “para baixo” (um aumento em custo). Isto acontece porque a empresa está meramente removendo ineficiências. Em outras palavras, no ponto 1 a empresa pode obter algo meramente trabalhando mais inteligentemente, ao invés de mais “duramente”. Empresas que atingem a fronteira do que um dado modelo de negócio pode fazer são empresas chamadas operacionalmente excelentes, na opinião de Porter.
A empresa pode explorar diferentes tipos de trade-offs para atingir um diferente ponto na fronteira, competindo no ponto 3 ao se mover para cima (com redução em custo) do ponto 1, sem se mover para a esquerda (uma redução de valor não-preço). Uma vez que as empresas estejam na fronteira, no entanto, mudanças em custos e valor não-preço são inextricavelmente relacionadas: mais de um necessariamente significa menos do outro. Logo, os pontos 2 e 3 são estratégias qualitativamente diferentes porque elas estão em diferentes pontos na mesma fronteira.
Sendo assim, a estratégia de uma empresa é definida pelos trade-offs inerentes ao seu modelo de negócio, ou às atividades que ela desempenha de forma a entregar valor aos consumidores. Um modelo de negócio de uma empresa é estrategicamente diferenciado à medida que ele explora um diferente conjunto de trade-offs do que seus competidores, escolhendo, por exemplo, prover alta qualidade, mas a um custo mais alto, e daí, preço.
Olhando sob o prisma dos bons mandamentos da Engenharia de Software, a empresa pode escolher entre desenvolver sistemas bons e complexos, ou, no outro limite, fazer Sistemas do tipo “big ball of mud” ou “worse is better”. Para fazer sistemas complexos, ela pode sair de 1 (onde produz sistemas não-complexos) para 2, sem aumentar custo, incrementando sua eficácia operacional. Ela também pode sair de 1 para 3, como já explicitado. Mas, chegando na fronteira, ela terá que enfrentar o trade-off entre custo e valor não-preço.
No entanto, é preciso reconhecer que a fronteira de produtividade não é estática. Avanços na tecnologia e em inovações podem permitir deslocamentos da fronteira da produtividade quebrando os trade-offs originais (ver Figura 3). Neste sentido, é possível dizer que a Estratégia é definida pelos trade-offs que a empresa explora, enquanto a Inovação é definida pelos trade-offs que ela quebra, ou seja, quando ela decide romper com os trade-offs que enfrenta.
Em resumo, a empresa de TICs pode optar entre estratégias competitivas ou inovar para avançar sua fronteira de produtividade, fazendo com que haja um impulso para a produção de sistemas melhores, ou seja, sistemas de alta qualidade (Hyper Complex Systems), como ilustrado na Figura 3.
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre fronteira de produtividade, fique a vontade para nos contatar!
(*) Característica de um sistema de software que não apresenta uma arquitetura perceptível. Apesar de indesejável de um ponto de vista da engenharia de software, tais sistemas são comuns na prática devido às pressões de negócios, rotatividade de desenvolvedores, e entropia de código (exemplo colhido a partir de um diálogo com o Prof. Paulo Borba, do Centro de Informática da UFPE);
(**) Característico da ideia de que qualidade não necessariamente aumenta com funcionalidade - que há um ponto onde menos funcionalidade (pior) é uma opção preferencial (melhor) em termos de praticalidade e usabilidade (exemplo também colhido a partir de um diálogo com o Prof. Paulo Borba, do Centro de Informática da UFPE);