Uma importante âncora do arcabouço da política macroeconômica brasileira é o regime de taxa de câmbio flexível (ou flutuante). Uma vez que alguma persistência de volatilidade excessiva no foreign exchange - FX - market (mercado de câmbio) possa influenciar as expectativas dos agentes econômicos, o Banco Central do Brasil - BCB pode intervir ocasionalmente para assegurar a operação suave do mercado de câmbio.

E para uma intervenção no mercado de câmbio, o BCB pode empregar FX derivatives (derivativos cambiais). Por exemplo, contratos de FX (currency) swaps (de conversão de moedas) comprados pelo BCB podem oferecer uma alternativa para traders que demandem moeda estrangeira para propósitos financeiros – especulativos ou de hedging/proteção – mais do que por razões transacionais. Adicionalmente ou alternativamente, o BCB pode vender moeda estrangeira no mercado à vista e/ou oferecer FX repo lines of credit (linhas de crédito no mercado estrangeiro de recompra) (*).

E qual é a radiografia do mercado global de derivativos cambiais? Os derivativos cambiais (tais como FX swaps, forwards, e currency swaps) requerem que o total principal da transação seja cambiado na sua maturidade. Isto distingue tais derivativos de outros tipos de derivativos em que o principal não é cambiado.

Bancos e empresas financeiras não-bancárias são os maiores usuários de FX swaps. Eles os usam para financiar e proteger portfólios, bem como para tomar decisões financeiras. A maioria dos FX swaps tem o dólar de um lado, e tem maturidades de curto prazo. Isto torna os mercados de FX swaps vulneráveis aos apertos de funding/financiamento do dólar. Isto foi constatado durante a Grande Crise Financeira (de 2008/09) e novamente em março de 2020, quando a pandemia da COVID 19 se tornou global.

Como notado recentemente em artigo publicado pelo BIS – Bank of International Settlements, um fato que inibe um conhecimento mais apurado deste mercado, é que como as obrigações de pagamento dos FX swaps não são registradas nos balanços patrimoniais, elas geralmente não são observadas nas estatísticas padrão de dívidas.

Seus autores observam que a escala das obrigações em dólar é impressionante, em mais de US$ 80 trilhões em meados de 2022. A maioria desta dívida em dólar é provavelmente devida por entidades fora dos EUA, para os quais o dólar é a moeda estrangeira. Em meados de 2022 as empresas não-bancárias fora dos EUA deviam algo como US$ 26 trilhões (em dívida não registrada), uma subida do patamar de US$ 17 trilhões em 2016.

De forma semelhante, bancos não norte-americanos deviam algo como US$ 35 trilhões, comparados a uma estimativa de US$ 15 trilhões em dívida em dólar nos seus balanços patrimoniais. Como tais dívidas estão ausentes nas estatísticas padrão de dívida, é difícil para os analistas anteciparem a escala e geografia das necessidades de rolagem em dólar.

Em outro trabalho do BIS é feita uma tentativa de registrar as posições de bancos nos FX swaps. Segundo este trabalho, em um dia típico quase US$ 4 trilhões são vistos em novos contratos de FX swaps, e a maioria envolve pagamento em dólar norte-americano. E os principais achados do trabalho são três, relacionados com a tomada e o empréstimo de dólares norte-americanos contra moedas chave via FX derivatives (derivativos cambiais):

- Primeiramente, o dólar emprestado via FX derivatives cresceu à medida que esta atividade se tornou lucrativa. A base do dólar, isto é, o prêmio conquistado (sobre as taxas do mercado de moeda) ao emprestar dólares contra outras moedas via FX derivatives tem possibilitado lucros aos bancos com amplo funding de dollar cash. Uma estimativa dos empréstimos líquidos de bancos nos EUA e na zona do euro via FX derivatives ultrapassou US$ 1 trilhão no primeiro trimestre de 2021, mais do que triplicou a quantidade em meados de 2013. Os bancos japoneses têm sido consistentemente tomadores líquidos de empréstimos de dólares via FX derivatives;

- Em segundo lugar, uma combinação de dados mostra que os bancos tendem a acomodar a demanda de consumidores por serviços de FX hedging/proteção ao se voltarem para o mercado interbancário de FX swaps. As estimativas líquidas de empréstimos de dólar pelos bancos dos EUA, fora dos balanços, aos consumidores, cresceu significativamente entre 2016 e 2020. Eles assim o fazem principalmente ao tomarem dólares emprestados via FX swaps interbancários, mais do que via um ajuste nas suas posições nos balanços patrimoniais. Estimativas para os bancos da zona do euro e do Japão também mostram que mudanças nos FX swaps interbancários desviam mudanças em posições com consumidores;

- Em terceiro lugar, os bancos dos EUA se mostram como pivotais no mercado de FX swaps. Em particular, os bancos japoneses que convertem yens em euros, e bancos da zona do euro convertendo na outra direção, ambos transacionam via o dólar norte-americano, principalmente com os bancos dos EUA, mais do que uns com os outros. Em adição, os bancos dos EUA se engajam em transformação de maturidade em FX swaps envolvendo dólar norte-americano: eles canalizam dólares tomados emprestado no curto prazo de outros bancos para não-bancos buscando proteção de longo prazo. De alguma forma, contra intuitivamente, isto torna os bancos dos EUA tomadores líquidos de empréstimo de dólar no mercado interbancário de FX swaps.

Em resumo, as obrigações de pagamentos que estão emergindo de FX swaps (derivativos cambiais) são enormes, crescentes, mas são opacas. E a natureza de curto prazo destes instrumentos torna o mercado de FX swaps susceptível a apertos de funding. E como a grande maioria dessas dívidas é em dólar, os movimentos do dólar passam a merecer uma atenção mais que devida!

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre derivativos cambiais, não hesite em nos contatar!

(*) https://www.bcb.gov.br/en/financialstability/fxswap