Apesar do contínuo aumento no número total de empresas nos EUA, o número de empresas listadas nas bolsas de valores tem declinado cerca de 50%, do peak de 8.090 empresas em 1996 para 4.266 empresas em 2019. Esta tendência coincide com um declínio nos IPOs (Initial Public Offering) nos EUA, resultando em menos empresas pequenas e jovens indo a público em anos recentes. Este declínio geral no número de listagens está estabelecido como um fenômeno abnormal estadunidense chamado “the US listing gap” (Lattanzio et al., 2023).
Mas quais são os principais determinantes deste hiato em listagens nas bolsas de valores nos EUA? Três canais são comumente citados como causadores do abnormal declínio nas listagens nos EUA. Primeiro, fusões e aquisições (F&A) estão associadas ao declínio nas listagens e no aumento nas deslistagens. Em segundo, o crescimento do mercado de private equity (PE) que está associado com a redução nos custos de financiamento para empresas privadas, e com o decrescimento nos seus incentivos a irem a público. Terceiro, mudanças regulatórias no início dos anos 2000, particularmente a Lei Sarbanes-Oxley (SOX) de 2002 (*), que são acusadas de aumentarem os custos de operação de uma empresa como uma “public company” (empresas com capital aberto) (Lattanzio et al., 2023).
Como apontam Lattanzio et al., 2023, estes canais são tipicamente estudados isoladamente. Mas, pelo fato de cada canal abranger implicações econômicas e políticas diferentes, é importante analisá-los num arcabouço unificado para determinar suas contribuições para o listing gap dos EUA. Este foi então o objetivo do estudo de Lattanzio et al., 2023.
Os autores compararam e quantificaram os efeitos dos canais de F&A, PE e regulatórios na expansão do hiato de listagens dos EUA em um arcabouço unificado. Eles constataram que a atividade de F&A é o principal motor do hiato de listagem. Eles também ofertaram evidência sugerindo que a regulação das bolsas de valores nos EUA aumentou significativamente o hiato de listagem. No entanto, a atividade de PE não aumentou o hiato de listagem, e marginalmente a reduziu.
Dado o importante papel das F&A, eles então especificaram os tipos de fusões que causaram o hiato de listagem. Finalmente, eles mostraram que apesar do número agregado de listagem de empresas não-estadunidenses ter aumentado, o hiato de listagens emerge em grandes economias não estadunidenses, tais como França, Alemanha e Reino Unido, uns poucos anos depois dos EUA. Os hiatos em listagens não-EUA são também primariamente guiados pela atividade de fusões.
Este fenômeno do hiato de listagens nas bolsas de valores tem contribuído para a busca (por parte das bolsas) de outras fontes de receitas. Em matéria no dia 16/11/2023, o Financial Times - FT apontou que o mercado britânico perdeu 44% das empresas listadas entre 1997 e 2019. O grupo que comanda a Bolsa de Londres (o London Stock Exchange Group – LSE Group) obtém menos de 4% de suas receitas com a listagem e negociação de ações, um número que vem sendo ofuscado pelos negócios com dados e análises que adquiriu e desenvolveu desde 2017, e que agora respondem por dois terços de suas receitas.
Segundo a matéria do FT a aquisição da empresa Refinitiv por US$ 27 bilhões em 2019 a transformou em um dos maiores grupos de dados financeiros do mundo. O LSEG espera que esse negócio o consolide no sistema que sustenta os mercados de capitais globais. Uma nova parceria com a Microsoft para o desenvolvimento de um terminal de análises em ambiente de trabalho para concorrer com a Bloomberg, mostra que os administradores do LSEG estão dobrando suas apostas nessa estratégia.
O Brasil, aparentemente, não tem estado indiferente ao fenômeno do “listing gap”. Pelas recentes movimentações da B3 (a bolsa de valores do país), com suas aquisições das empresas Neoway e Neurotech, empresas associadas à economia dos dados, percebe-se que a monetização de dados está vindo para ficar na área de finanças.
Se sua empresa, organização ou instituição, deseja saber mais sobre o hiato de listagens nas bolsas de valores, não hesite em nos contatar”
(*) A Lei Sarbanes-Oxley (em inglês, Sarbanes-Oxley Act) lei dos Estados Unidos, assinada em 30 de julho de 2002 pelo senador Paul Sarbanes (Democrata de Maryland) e pelo deputado Michael Oxley (Republicano de Ohio). Motivada por escândalos financeiros corporativos (dentre eles o da Enron, que acabou por afetar drasticamente a empresa de auditoria Arthur Andersen), essa lei foi redigida com o objetivo de evitar o esvaziamento dos investimentos financeiros e a fuga dos investidores causada pela aparente insegurança a respeito da governança adequada das empresas.