No dia 19 de outubro do corrente ano a agência de notícias Bloomberg publicou um artigo intitulado “The Price of Money Is Going Up, and It´s Not Because of the Fed” (O Preço da Moeda Está Subindo, e Não é Por Causa do Fed), produzido por Jamie Rush, Martin Ademmer, Maeva Cousin e Tom Orlik. Em seu subtítulo, o artigo aponta que um modelo concebido pela equipe da Bloomberg Economics, que olha para um horizonte como o do ano de 2050, mostra que os rendimentos do Tesouro estadunidense permanecerão altos, como em torno de 6%.
O artigo é precioso porque tenta explicar, de forma bastante simples, algo que é muitas vezes complexo para o cidadão comum, tal como responder à seguinte questão: Qual é o preço mais importante na economia global? O preço do barril do petróleo? Um microchip? Ou talvez um Big Mac? Para o artigo, mais importante de que qualquer um destes é o preço da moeda (dinheiro). Por mais de três décadas este preço (nos EUA) esteve caindo. Agora ele está subindo.
Tome-se o yield (a rentabilidade, ou retorno que o investidor receberá do Fed – Federal Reserve - pela compra dos seus papeis) das notas do Tesouro estadunidense com vencimento de 10 anos, as quais subiram para perto de 5% nas semanas recentes, empurrando para cima o custo das hipotecas e empréstimos corporativos. À primeira vista pareceu como se o mercado estivesse reagindo a mais um relatório bolha no mercado de trabalho (denotando uma pujança). Mas quando o que parecia ser uma pontinha, tornando uma derrota para o mercado de títulos, uma explicação alternativa emergiu: investidores estão finalmente começando a entender que algo fundamental mudou. A moeda irá permanecer cara por um bom período enquanto – e não porque está levando mais tempo do que o esperado para o Fed combater a inflação.
Pergunte à maioria das pessoas como o preço da moeda é estabelecido e elas dirão “pelos bancos centrais”. É verdade, o Fed está encarregado de estabelecer as taxas de juros. Mas, intrinsecamente, o preço da moeda, tal como o preço de qualquer outra coisa, reflete o balanço da oferta e da demanda. Quando a oferta de poupanças se expande porque, diga-se, os trabalhadores estão guardando mais dos seus contracheques, logo, o custo cai. Se é a demanda por investimentos que está crescendo rapidamente – porque o governo está derramando moeda em melhorias de estradas ou empresas estão espirrando em robôs fabris – logo, o custo sobe.
Para os especialistas econômicos, o preço da moeda que balanceia poupanças e investimentos enquanto mantém a inflação estável é chamado a “taxa de juros natural”, ou r* (r estrela) (1). Para entender por que este conceito é central para o policymaking (produção de políticas), imagine o que aconteceria se o Fed estabelecesse custos de empréstimos abaixo da taxa natural. Com o dinheiro muito barato, haveria muito investimento e pouca poupança, e a economia poderia aquecer, levando a inflação para uma espiral ascendente. Alternativamente, se o Fed estabelecesse os custos de empréstimos acima da taxa natural, haveria muita poupança e pouco investimento, e a economia poderia esfriar, empurrando o desemprego para cima.
Este equilíbrio é notoriamente difícil de fixar. Quando economistas avaliam políticas de taxas de juros, eles olham para a taxa de juros natural – r* - a qual sinaliza uma política monetária nem restritiva nem expansionista. Mais que isso, a r* é um meio termo. Como um benchmark chave de política monetária e fiscal, ela ancora taxas reais e tem implicações para a instância da política monetária. Enquanto estimar r* é cheio de dificuldades, as últimas evidências sugerem que a política monetária dos EUA provavelmente se tornou restritiva no começo de 2023, depois do Fed ter começado a subir as taxas em março de 2022.
O conceito da r* tem suas raízes no trabalho do economista sueco Knut Wicksell e outros no século 19. Os economistas Thomas Laubach e o agora novo Presidente do New York Fed John Williams, em um influente artigo de 2003, popularizaram a visão moderna da r* como “a taxa de juros real de curto prazo consistente com o output (PIB) convergindo para o potencial, onde potencial é o nível de output consistente com inflação estável”.
A r* ganhou tração em 1993 como o termo intercepto na famosa regra de política de taxa de juros do economista John Taylor, “escrita em termos reais com a taxa defasada de inflação servindo como uma proxy para a inflação esperada”. Uma mudança pelos bancos centrais em direção a uma estratégia de metas de taxas de juros de curto prazo durante os anos 1980s, e o arcabouço analítico que emergiu nos anos 1990s – o chamado Modelo Novo Keynesiano” – estabeleceram ainda mais a r* como um conceito chave para a política monetária.
Quando uma política rastreia a r*, como a regra de Taylor, a taxa natural influencia a política de juros e, por extensão, as taxas de juros ao longo de todas as maturidades. No entanto, tal estratégia não necessariamente garante um resultado ótimo. A subotimalidade pode surgir quando tanto rigidezes nominais e reais coexistem – isto é, preços e remunerações são lentos em responderem (os conhecidos “stick prices and wages”) (2).
O caráter restritivo da política monetária pode ser aferido ao examinar o hiato entre a 3-month (short-term) real (inflation-adjusted) rate [taxa real curto prazo (3 meses) ajustada pela inflação] e a correspondente r* de 3 meses. Quando o termo de curto prazo da taxa real é equivalente ao termo de curto prazo da r*, a política monetária é neutra. A política monetária é restritiva quando a taxa real está acima da r*, e é expansionista quando ela está abaixo. Isto é consistente com a regra de Taylor – quando a inflação e o hiato econômico indicam que a economia está operando em balanço em níveis acima ou abaixo daqueles consistentes com o mandato dual do Fed de máximo emprego e preços estáveis.
E como a taxa de juros real neutra é avaliada pelo Banco Central do Brasil? E como você empresa, organização ou instituição forma suas expectativas sobre o preço da moeda/dinheiro? Este é um interessante assunto, mas que fica para uma outra oportunidade!
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre o preço da moeda/dinheiro, não hesite em nos contatar!
- Discordâncias sobre as taxas de juros nominais futuras criam desafios para o entendimento das políticas monetárias. Sendo assim Joseph Platzer, Robin Tietz e Jesper Linde fazem o seguinte esclarecimento. A taxa de juros natural está associada à “taxa de juros neutra”. A taxa de juros real neutra (que não é observável e pode ser estimada com alta incerteza) tem um componente lento e de longo prazo, bem como um componente de curto prazo. A taxa de juros natural de longo prazo é determinada por características demográficas e de desigualdade de renda, enquanto a taxa de juros neutra de curto prazo pode ser afetada por choques econômicos transitórios.
- Em outra oportunidade trataremos outros tipos de rigidezes (stickness) ou fricções que não somente por preços e remunerações.