Em 1972 o Economista e Professor Robert Lucas (Prêmio Nobel de Economia de 1995) publicou, no Journal of Economic Theory, o influente artigo intitulado “Expectations and the Neutrality of Money” (Expectativas e a Neutralidade da Moeda). Prof. Lucas estudou expectativas e a neutralidade (1) - e a não-neutralidade temporária – da, como o título do artigo diz, moeda. Segundo o Economista John H. Cochrane, este artigo foi o alicerce da moderna economia monetária intertemporal.
No entanto, como aponta Cochrane, nossos bancos centrais estabelecem taxas de juros. O Federal Reserve (FED - banco central estadunidense) nem mesmo pretende controlar a oferta de moeda, especialmente moeda interna (2). Não há requisitos de reservas. A quantidade de M2 (um dos agregados monetários) é qualquer coisa que as pessoas sintam como mantendo aquela forma. Reservas superabundantes pagam o mesmo, ou mais, juros que títulos do tesouro de curto prazo e mercados de moeda overnight.
O FED controla taxas de juros ao mudar os juros que oferece em reservas abundantes, e não por racionar reservas escassas de juro zero. Outros bancos centrais seguem políticas similares. Com uma oferta de moeda passiva (3), a teoria monetarista não pode determinar o nível de preço. É uma teoria interessante, mas inconsistente com as presentes instituições.
Sendo assim, como argumenta Cochrane (4), nós precisamos de uma análoga teoria de inflação sob metas de taxas de juros. Idealmente, a teoria deve também ser baseada em ciência econômica robusta e limpa, começando com um benchmark sem fricção bem descrito e neutro, e adicionando fricções mínimas para descrever não-neutralidade temporária. A teoria deve ser consistente com as instituições presentes, incluindo uma meta de taxas de juros, amplas reservas que paguem juros de mercado, nenhum controle de moeda interna, e uma descrição plausível de como os bancos centrais operam. Seus mecanismos básicos e sinais deveriam ser explicáveis para estudantes de graduação, banqueiros centrais, e leigos.
E foi neste contexto que Cochrane publicou, na Review of Economic Dynamics de julho do corrente ano, seu importante artigo intitulado “Expectations and the neutrality of interest rates” (Expectativas e neutralidade das taxas de juros). Neste artigo, que tem a qualidade necessária para garantir uma posição de destaque na literatura econômica, Cochrane oferece uma breve e estilizada história dos esforços para desenvolver tal teoria.
Ele argumenta que ao integrar metas de taxas de juros, expectativas racionais (campo de estudos co-inaugurado por Robert Lucas), e teoria fiscal, nós temos pelo menos tal teoria. Nesta teoria, a inflação é estável e determinada sob uma indexação da taxa de juros, análoga à análise monetarista de uma regra de um k percentual de crescimento da moeda. A teoria começa com um benchmark sem fricção e neutro, e permanece aproximadamente neutro no longo prazo com preços rígidos.
No entanto, estabilidade e neutralidade de longo prazo inexoravelmente implicam que maiores taxas nominais de juros eventualmente produzem inflação maior, tal como crescimento maior da moeda eventualmente produz inflação maior em uma análise monetarista. O pedaço final, uma teoria de não-neutralidade temporária, a contribuição central de Lucas (1972) para a teoria baseada em moeda, é inacabada – ou, se está acabada, não é comumente aceito que os modelos que nós temos são os melhores que podemos fazer. Com preços rígidos, maiores taxas de juros reduzem o produto. Mas não está estabelecido se e como o banco central pode temporariamente reduzir a inflação ao aumentar a taxa de juros, sem um aperto fiscal contemporâneo.
Como assevera Cochrane, esta advertência fiscal é importante. Um aperto fiscal pode reduzir a inflação, e assim uma subida na taxa de juros pareada com um aperto fiscal pode baixar a inflação. Muitos modelos assumem que a política monetária induz tal aperto fiscal via uma política fiscal passiva. Mas bancos centrais não têm poder diretamente para apertar a política fiscal. A parear taxas de juros maiores com aperto fiscal deixa aberto como uma redução da inflação vem com taxas de juros maiores, e quanto é devido ao aperto fiscal induzido. A política monetária é somente uma cenoura em frente do cavalo fiscal que puxa o carro da inflação, pergunta Cochrane.
Por esta razão, o autor foca sua análise na seguinte questão: podem altas taxas de juros reduzir a inflação sem uma mudança nos superávits fiscais? Cochrane adiciona um conjunto de outras questões relevantes. Todavia, em benefício da síntese, cabe aqui registrar a importância histórica desta sua contribuição, que ele considera uma revisão sintética. A literatura da economia monetária contemporânea é cheia de modelos que adicionam ingredientes. O objetivo do autor neste artigo é o de simplificar e ver que ingredientes são realmente necessários para as propriedades básicas da política monetária. Alguns desses pontos são também vistos em mais profundidade em modelos mais complexos, com o tratado no seu livro referido em (4).
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Posfácio
É fundamental entender como é definida a chamada "real neutral rate of interest" (taxa real neutra de juros). Ela representa o nível real da taxa de juros consistente com uma inflação estável e um output (PIB) no seu potencial. Deste modo, se a taxa real da política monetária (do Banco Central) está abaixo do nível neutro, a instância da política monetária é dita como expansionista. Se ela está acima, a política monetária é dita como contracionista, colocando pressão para baixo na demanda agregada, e, consequentemente, na inflação e no hiato de produto (PIB). Com inflação corrente acima do alvo e com taxas de juros de curto prazo ainda baixas, os economistas argumentam que os bancos centrais precisam elevar as taxas de juros pelo menos ao nível da taxa neutra.
- Neutralidade monetária é uma teoria econômica que afirma que a moeda e a oferta de moeda não afetam qualquer variável econômica real, somente as nominais. Em outras palavras, a teoria diz que a quantidade de moeda emitida pelos bancos centrais pode impactar preços e salários, mas não o produto (PIB, por exemplo) ou a estrutura da economia.
- Moeda interna é a moeda emitida por intermediários privados na forma de dívida. Esse dinheiro está tipicamente na forma de depósitos à vista ou outros depósitos e, portanto, faz parte da oferta monetária.
- Oferta de moeda passiva é uma condição de modelos macroeconômicos onde a taxa de juros é exógena (ou seja, é uma variável cuja medida é determinada fora do modelo; em contraste, na variável endógena sua medida é determinada pelo modelo), e a oferta de moeda se ajusta passivamente à demanda, como determinada pela taxa de juros, pela renda real e o nível de preço.
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Cochrane já foi tratado aqui nesta newsletter quando apresentamos sua “Fiscal Theory of Price Level” (Teoria Fiscal do Nível de Preço) => Inflação: Um fenômeno monetário ou fiscal? Ambos, mas não somente!.