O título desta newsletter é o título do capítulo 2 do mais recente “Global Financial Stability Report- The Last Mile: Financial Vulnerabilities and Risks”, do Fundo Monetário Internacional- FMI, publicado em 16-04-2024. Este tradicional relatório avalia vulnerabilidades chave a que o sistema financeiro global está exposto. Em tempos normais, o relatório busca desempenhar um papel na prevenção de crises ao iluminar políticas que podem mitigar riscos sistêmicos, portanto, contribuindo para a estabilidade financeira global e o crescimento econômico sustentado dos países membros do FMI.

Relatórios como este do FMI não são simples de serem resumidos. Aproveitando partes do seu resumo executivo, é possível dizer que o sentimento do mercado financeiro (desde a publicação do Global Financial Stability Report-GFSR de outubro de 2023) é flutuante nas expectativas de que a desinflação global está entrando sua “last mile” (última milha – daí o subtítulo do relatório de 2024), e a política monetária será afrouxada.

Um tema a destacar neste GFSR-2024 é aquele do seu capítulo 2 (e que se tornou matéria de editorial do jornal Estado de São Paulo, com o título apocalíptico de “Protótipo de bomba financeira”, de 18-04-2024). O capítulo avalia vulnerabilidades e potenciais riscos para a estabilidade financeira no crédito corporativo privado, uma classe de ativo rapidamente crescente – tradicionalmente focada em prover empréstimos para empresas de médio porte fora dos ambientes tanto dos bancos comerciais quanto dos mercados de dívidas públicas – que agora rivalizam outros maiores mercados de crédito em tamanho (1).

Para o GFSR-2024 o crédito privado cria significativos benefícios econômicos ao prover financiamento de longo prazo para empresas muito grandes ou arriscadas para os bancos e muito pequenas para os mercados públicos. No entanto, o crédito migrando dos bancos regulados e mercados públicos relativamente transparentes para o mais opaco mundo do crédito privado cria riscos potenciais.

As empresas tomando emprestado crédito privado tendem a ser menores e mais arriscadas do que suas contrapartes dos mercados públicos, e o setor nunca experimentou uma desaceleração econômica severa no seu tamanho e escopo presentes. Tal cenário adverso poderá ver uma realização atrasada de perdas seguida por uma disparada de calotes e grandes reduções em valorações.

O capítulo identifica vulnerabilidades surgindo de frágeis tomadores de empréstimo, exposição aumentada de pensões e seguradores ao tipo de classe de ativo, uma crescente participação de veículos de investimentos semilíquidos, múltiplas camadas de alavancagem, valorações obsoletas, e interconexões pouco transparentes entre participantes.

Existe um outro conjunto de riscos, mas cabe aqui assinalar as recomendações de política apontadas no capítulo. A saber:

  • Encorajar as autoridades a considerarem um enfoque supervisor e regulador mais intrusivo para os fundos de crédito privado, seus investidores institucionais, e provedores de alavancagem;
  • Fechar os hiatos de dados de forma que supervisores e reguladores possam, de forma mais compreensiva, avaliar riscos, incluindo alavancagem, interconexões, e o acúmulo da concentração dos investidores. Fortalecer a reportagem de requisitos para fundos de crédito privado e seus investidores, e provedores de alavancagem para permitir monitoramento e gestão de risco;
  • Monitorar mais de perto e endereçar liquidez e conduzir riscos em fundos – especialmente de varejo – que possam enfrentar maiores resgates arriscados. Implementar design relevante de produto e recomendações de gestão de liquidez do Financial Stability Board e das International Organization of Securities Commissions;
  • Fortalecer cooperação regulatória cruzada e transfronteiras e fazer avaliações de risco de ativo mais consistentes ao longo de setores financeiros.

Não restam dúvidas que a arquitetura do sistema financeiro global está adquirindo um formato cada vez mais complexo, no qual uma competente governança se torna um ingrediente fundamental para o crescimento econômico dos países. Eis aí um desafio instigante a ser enfrentado!

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre a ascensão e riscos do crédito privado, não hesite em nos contatar!

  1. Neste espaço de newsletters já tivemos a oportunidade de registrar esta modalidade de atividade financeira, quando tratamos do que se chamava há algum tempo de “shadow banking system”, e agora é reconhecida pelas “non-bank institutions” – NBI ou “non-bank financial institutions” - NBFI. Ver as seguintes newsletters relacionadas: