Nas newsletters de 25-06-2023, 03-07-2023, e de 10-07-2023 tratamos da temática do Shadow Banking System (Sistema Bancário Sombra), o sistema que inclui todas as entidades fora do sistema bancário regulado que desempenham o centro da função bancária: intermediação (ou seja, pegar dinheiro de poupadores e emprestá-lo a tomadores de empréstimo).

Ao produzirmos a série nos deparamos com as seguintes questões: a) a China, por sua importância econômica global, tem o seu “shadow banking system”? b) Ele está documentado? A resposta à primeira questão é sim, e a resposta à segunda é: o suficiente para que se possa analisar e comentar! Neste sentido, esta série tem como objetivo fazer um brevíssimo relato do que é o shadow banking system chinês e sua importância para a economia daquele país e para o mundo.

Um dos registros mais acurados e representativos tecnicamente que pudemos encontrar sobre o shadow banking system chinês vem de um técnico do próprio Banco Central da China, em trabalho publicado em novembro de 2019 pelo BIS – Bank for International Settlements. Neste trabalho, Guofeng Sun analisa os mecanismos de criação de moeda do shadow banking system chinês em detalhes, provê medidas acuradas, investiga seus efeitos em risco financeiro, e pesquisa recente regulação.

No seu papel de regulador, o autor recomenda que para fortalecer a supervisão, os reguladores chineses deveriam rastrear de perto a evolução de vários canais do shadow banking system, tanto dentro quanto fora dos balanços. Ademais, recomenda ainda que ferramentas de regulação macro prudenciais, tais como reservas de ativos e reservas de risco, deveriam ser aplicadas separadamente para os “shadow banks” e para o “traditional shadow banking” (duas categorias analíticas propostas pelo autor).

De acordo com Guofeng Sun, nos anos recentes o shadow banking system da China se tornou uma parte integral do sistema financeiro. Ao contrário do caso das economias avançadas (que contempla uma diversidade de entidades), o shadow banking system na China é dominado por bancos comerciais, uma vez que o sistema financeiro chinês é dominado por bancos. Uma característica chave do shadow banking system da China é que os bancos escondem empréstimos no seio de categorias alternativas contábeis.

O shadow banking system da China pode ser definido a partir da perspectiva da criação de moeda crédito, tornando mais claras as diferenças (apontadas por Guofeng Sun) entre duas categorias de shadow banking system: a “banks´ shadow” (sombra de bancos) e o traditional shadow banking. A banks´ shadow é definida como criação de moeda de bancos através de tratamentos contábeis que geram passivos a partir dos ativos, enquanto o traditional shadow banking se refere à criação de crédito por non-bank financial intermediaries – NBFI (intermediários financeiros não bancos) através de transferência de moeda. Ambos ofertam funding sob o shadow banking system, mas somente a “banks´shadow” cria uma oferta de moeda, daí afetando um objetivo intermediário de política monetária do People´s Bank of China – PBC (Banco do Povo da China).

Enquanto o traditional banking system funciona na China tal como nas economias avançadas, a “banks´shadow” consiste essencialmente de empréstimos que tomam a forma de outros tipos de ativos, colocando desafios para a efetividade da política monetária e para a regulação financeira. Primeiramente, a “banks´s shadow” prejudica a habilidade da política monetária influenciar a criação de moeda e tomada de risco, fazendo crescer riscos de estabilidade financeira. Em segundo lugar, ela prejudica a efetividade das regulações bancárias voltadas para a atividade de emprestar, e levando à acumulação de risco sistêmico.

A “banks´ shadow” alonga a cadeia de financiamento social, e é acompanhada por práticas de contabilidade não padronizadas. Isto leva a uma severa assimetria de informação e a uma crescente instabilidade da demanda por liquidez dos bancos. Enfrentando uma escassez estrutural de liquidez, autoridades monetárias dependem principalmente de condições de liquidez no sistema bancário para controlar o financiamento social total. No entanto, a instabilidade da demanda dos bancos por liquidez, induzida pelas atividades da “banks´shadow”, torna mais difícil para as autoridades monetárias regularem o ambiente monetário através do controle da liquidez.

Outro aspecto é que o shadow banking system nos mercados desenvolvidos é usualmente baseado no mercado, operando em paralelo com os bancos. Ele é organizado em torno de securitização e funding no atacado. O mecanismo uma engenharia financeira que securitiza empréstimos, leases, e hipotecas em instrumentos comercializáveis. O funding é levantado através de mercados de capitais usando special purpose entities – SPEs (entidades de propósito especial), tais como comercial papers (papeis comerciais) e repossesion agreements (acordos repo – mercado de recompras).

Como aponta Guofeng Sun, a arbitragem regulatória é acreditada como sendo um motor chave para a emergência do shadow banking system mundo afora. O caso da China é similar, mas é mais complexo, dadas as regulações bancárias únicas da China, tais como depósitos e taxas de empréstimos regulados, em adição a certas restrições de empréstimos.

Mas como é possível mensurar o tamanho e a importância do shadow banking system da China? Eis aí o tema para a próxima newsletter!

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre o shadow banking system da China, não hesite em nos contatar!