A Profa. Carlota Perez, nascida na Venezuela, mas com vida acadêmica de sucesso na Europa, tem uma longa e importante contribuição ao estudo das tecnologias e inovações e seu papel no desenvolvimento. Em anos recentes ela vem sendo muito citada por importantes personalidades ligadas ao mundo das TICs, particularmente pelos capitalistas de risco, tais como Marc Andreessen, Fred Wilson e Jerry Neumann.
Mas qual é a relação entre a visão de mundo da Profa. Perez e o futuro do Brasil? O que pretendemos argumentar (iniciando com esta newsletter) é que temos muito ganhar ao pensar o “Futuro do Brasil” a partir de uma perspectiva de longo prazo, apoiada no desenvolvimento científico, tecnológico e de inovações, bem como dos desdobramentos socioeconômicos, políticos e ambientais decorrentes desse tipo de desenvolvimento, como proposto pela Profa. Perez, particularmente no seu livro mais conhecido, intitulado Technological Revolutions and Financial Capital: The Dynamics of Bubbles and Golden Ages (Revoluções Tecnológicas e Capital Financeiro: A Dinâmica de Bolhas e Eras de Ouro), publicado em 2002.
A Profa. Perez estudou profundamente as grandes revoluções tecnológicas desde a revolução industrial, como elas foram impactadas e como impactaram os mercados financeiros. Baseada em 200 anos de história, ela identificou quatro revoluções tecnológicas antes da atual (Thompson, 2021):
● A Revolução Industrial começou na Grã-Bretanha em 1771, com a abertura da primeira fiação de algodão (movida a água) do mundo, na cidade de Cromford, na Inglaterra;
● A Idade do Vapor e das Estradas de Ferro começou no Reino Unido em 1829, com o teste do engenho a vapor “Rocket” para a linha de trem entre Liverpool e Manchester;
● A Idade do Aço, Eletricidade e Engenharia Pesada começou nos EUA em 1875, com a abertura da planta de aço Carnegie Bessemer em Pittsburgh, na Pensylvania;
● A Idade do Petróleo, do Automóvel, e da Produção em Massa começou nos EUA em 1908, com a produção do primeiro Modelo T da Ford, em Detroit, Michigan;
● A Idade da Informação e das Telecomunicações começou nos EUA em 1971, com o anúncio do microprocessador Intel, em Santa Clara, na Califórnia.
Ao pesquisar sobre as quatro revoluções que antecederam a Idade da Informação e das Telecomunicações, a Profa. Perez observou que elas seguiram um padrão similar, como o ciclo observado na Figura 1 à frente. O ciclo de vida da revolução tecnológica é composto de dois períodos de distinta natureza: i) um de instalação, quando a tecnologia vem ao mercado e a infraestrutura é construída (trilhos para as estradas de ferro, linhas de montagem para os carros, infraestrutura de redes e servidores para a internet), e, ii) outro de implantação, quando a tecnologia é amplamente adotada pela sociedade (o desenvolvimento da parte oeste dos EUA na era das ferrovias, a criação dos subúrbios, dos centros de compras, do fast food na era do automóvel, e a adoção os iPhones, Facebook, e dos compartilhamentos da era da internet móvel).
O processo de instalação de cada novo paradigma tecno-econômico na sociedade começa com uma batalha contra o poder do velho paradigma, estabelecido na estrutura produtiva e incorporado no ambiente sociocultural e no arcabouço institucional incumbente. O primeiro período começa com uma irrupção de uma nova tecnologia em busca de aplicações reais, a qual evolui para um frenesi, à medida que o capital especulativo persegue crescentemente aplicações comerciais fantásticas. Esse frenesi é uma força de propagação da revolução tecnológica, particularmente sua infraestrutura, e de fortalecimento da superioridade dos novos produtos, indústrias e tecnologias genéricas.
Como bem sintetizado por Thompson (2021), a ostentação de sucesso empurra a lógica do novo paradigma para o centro (das atenções em particular) e o torna o ideal contemporâneo de vitalidade e dinamismo. Ela também contribui para a mudança institucional, pelo menos no que diz respeito à “destruição” de metade da destruição criativa (termo originário do economista Joseph Schumpeter).
A excitação decorrente divide a sociedade, ampliando o hiato entre ricos e pobres, tornando-o menos sustentável em termos sociais. A economia se torna insustentável devido à presença de dois crescentes desbalanços. Um deles é a incompatibilidade entre o perfil da demanda e aquele da oferta potencial. O mesmo processo pelo qual o intenso investimento foi tornado possível pela concentração de renda no topo do espetro social, torna-se um obstáculo para a expansão da produção de um produto particular e para o alcance de economias plenas de escala. O outro desbalanço é a fenda entre os “valores no papel” e os valores reais. Deste modo, o sistema fica estruturalmente instável e não pode crescer indefinidamente naquele passo.
Com o colapso vem a recessão – algumas vezes depressão – trazendo o capital financeiro de volta à realidade. Inicia-se aí um “turning point” – ponto de inflexão, que dá lugar ao período de implantação do ciclo, que será tratado na próxima newsletter!
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