Há poucos dias dois artigos surgiram na correspondência eletrônica deste editor. O primeiro, intitulado “The End of Real Social Networks” (O Fim das Redes Sociais Reais), foi publicado recentemente no site Project Sindicate pelo economista Daron Acemoglu, Professor de Economia do MIT - Massachusetts Institute of Technology nos EUA, co-autor, junto com James A. Robinson, do aclamado livro “Why Nations Fail” (Por que Nações Fracassam).
No artigo citado, o autor aponta que as plataformas de mídia social não apenas estão criando “echo chambers” (câmaras de eco) (*), propagandeando falsidades, e facilitando a circulação de ideias extremistas. Segundo ele, inovações anteriores na mídia, voltando ao tempo da imprensa de Gutenberg, também fizeram isso, mas nenhuma delas mexeu tanto os alicerces da comunicação humana e da interação social; em resumo, as redes sociais reais estão sendo substituídas por redes sociais artificiais online.
O segundo artigo, intitulado “20 Years After 9/11, Surveillance Has Become a Way of Life” (20 Anos Depois de 09/11, Vigilância Se Tornou um Modo de Vida), foi publicado por Albert Fox Cahn, Diretor Executivo do Surveillance Technology Oversight Project (S.T.O.P.) (Projeto de Supervisão da Tecnologia de Vigilância) na revista Wired em 2021. O STOP luta pelo fim da vigilância discriminatória.
No artigo mencionado, o autor observava que duas décadas depois do ataque de 11 de setembro, muitos atos simples, que eram dados como certos e tranquilos, agora parecem impenetráveis: passeando com pessoas queridas em direção ao portão do seu voo, transitando nos corredores de uma corporação, usando ruas perto de prédios de governos. Os lugares comuns das metrópoles são agora acompanhados com aço e vigilância. No meio de uma pandemia perpétua do ano de 2020, as cidades se tornaram ainda mais emparedadas. Com cada nova barreira erigida, mais da característica definidora da cidade é erodida: a liberdade de movimento, e de perambular.
Estes dois artigos, aparentemente isolados e sem conexão, são, na opinião desta newsletter, dimensões de um mesmo, único e sem precedentes, fenômeno, que estamos denominando de “Reverso”, para contrastar com o termo, hoje em dia muito popular, de “Metaverso”. Enquanto o Metaverso vem sendo decantado em prosa e verso como sendo o “futuro” das relações humanas (com iterações da Internet como um mundo virtual único, universal e imersivo, usando realidade virtual e realidade aumentada), o “Reverso” se manifesta na reversão de formas de manifestações humanas conquistadas ao longo de milênios, tais como a liberdade de formar redes sociais reais, e a liberdade de ir e vir nas cidades sem vigilância de terceiros.
Não desejamos ir tão longe em afirmar, tal como a Prof. Shoshana Zuboff (autora do livro “The Age of Surveillance Capitalism” – A Era do Capitalismo de Vigilância), que estamos diante de uma nova forma de poder chamada de “surveillance capitalism” (capitalismo de vigilância), onde predominantemente poderosas companhias de tecnologia coletam nossas informações e as vendem àqueles que fizerem as maiores ofertas, sejam eles governos ou comerciantes.
O que pretendemos apontar é que tem havido muita atenção para a questão do Metaverso, e muito pouca para o fenômeno do “Reverso”; mas, ao mesmo tempo, desejamos argumentar que é absolutamente possível avançar sem que determinados ganhos humanos (conquistados a duras penas) sejam revertidos. Mas para isso, precisamos ter um senso de direção, ou seja, sabermos para onde pretendemos ir como Sociedade, e como seguir nessa direção.
Neste sentido, consideramos oportuna a reflexão que foi iniciada a partir de Johann Gevers, empreendedor suíço, e um dos fundadores do “Vale do Crypto”, na cidade de Zug, na Suíca. Em seu TED Talk intitulado “The Four Pillars of a Decentralized Society” (Os Quatro Pilares de uma Sociedade Descentralizada), Gevers faz uma inovadora defesa dos pilares de uma nova sociedade: a sociedade descentralizada.
Segundo ele, viemos de uma era primitiva onde a sociedade era descentralizada, mas localmente situada. Com o advento da Agricultura, transformamo-nos na sociedade centralizada que passamos a conhecer atualmente, e agora estamos caminhando em direção a uma sociedade descentralizada, só que agora ela é globalmente situada. E o catalisador dessa nova e potencial transformação em direção a uma sociedade descentralizada é o que ele chama de “The Technology of Trust” (A Tecnologia da Confiança).
Para Gevers, até recentemente nossas interações eram caracterizadas por “human based trust systems” (sistemas de confiança baseados em humanos), que infelizmente não escalam. Com o desenvolvimento tecnológico, agora nós podemos nos valer dos “technology based trust systems” (sistemas de confiança baseados em tecnologia), os quais podem escalar virtualmente sem limites.
Sendo assim, como proposta para uma sociedade globalmente descentralizada, Gevers aponta para quatro pilares básicos: a) Comunicações Descentralizadas (Internet e Criptografia); b) Sistema Jurídico Descentralizado (com escolha da lei, escolha do adjudicador, e escolha do garantidor); c) Produção Descentralizada (produção de materiais, produção de energia; d) Finanças Descentralizadas (com moeda descentralizada, e com sistemas de contratação descentralizados).
Em resumo, ao invés de estarmos apenas perseguindo um futuro em que as relações predominantes são artificiais (e vigiadas), ignorando ou substituindo conquistas humanas de gerações, seria oportuno se estivéssemos pensando em como caminharmos em uma direção que se utilizasse de complementaridades humanas, utilizando a tecnologia no que ela nos proporciona de melhor!
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre o “Reverso” e sobre Sociedade Descentralizada”, não hesite em nos contatar!
(*) Termo também conhecido como câmara de eco ideológica, que é uma descrição metafórica de uma situação em que informações, ideias ou crenças são amplificadas ou reforçadas pela comunicação e repetição de um sistema definido.