Na newsletter da semana passada, Safe Assets (Ativos Seguros) (Parte 1), iniciamos uma discussão sobre uma “Teoria de Ativos Seguros”, argumentando que tal teoria deve estar ancorada em uma “Teoria de Moeda”. Neste sentido, fomos buscar a contribuição do Prof. Markus Brunnermeir, da Universidade Princeton nos EUA, com sua “I Theory of Money”.

Tendo apontado algumas das principais distinções da I Theory of Money, quais são, por seu turno, os principais aspectos da Teoria de Ativos Seguros? O Prof. Brunnermeier define um ativo seguro a partir de duas características:

  • A analogia do “bom amigo”: Um ativo seguro é como um bom amigo que está ali quando alguém precisa, em tempos de stress de mercado. Esta definição contrasta com a do risk-free asset (ativo livre de risco), a qual paga uma quantidade específica a uma certa maturidade, mas pode flutuar em valor antes que amadureça;
  • A “safe-asset tautology” (tautologia do ativo seguro): Um ativo seguro é seguro porque outros o percebem ser seguro. Em tempos de stress financeiro, os agentes coordenam os investimentos em ativos seguros.

Esta definição de ativo seguro pode ser vista como uma definição de broad money (moeda no conceito amplo): ela inclui uma ampla variedade de government-issued paper (título emitido pelo governo) de diferentes maturidades, bem como inside money (moeda criada pelo sistema bancário) emitida pelo setor privado.

O Prof. Brunnermeir aponta ainda que risco desempenha um papel central na moderna precificação de ativos. No entanto, o foco é primariamente em recompensas de fluxos de caixa de ativos e reivindicações. O valor fundamental de um ativo é certamente derivado de um fluxo de recompensas arriscadas futuras descontadas. Contudo, em um mundo com fricções financeiras, vários outros aspectos podem turbinar o valor de um ativo (e, então, diminuir seu esperado retorno).

Primeiramente, um ativo tem um benefício adicional se ele pode ser usado como uma reserva de valor segura que pode ser vendida a um preço relativamente estável depois de um choque adverso. Este componente de “ativo seguro” pode estimular significativamente seu valor. Para este benefício surgir, o ativo deve desfrutar de alta liquidez de mercado, i. e., ele pode ser vendido sem um grande desconto, quando alguém precisar de fundos.

Tal como um “bom amigo”, ela está ali quando você necessitar dele. Ativos seguros ofertam um “serviço de seguro” em um mundo quando contratos explícitos de seguro estão em falta. Investidores ficam desejosos em reter ativos seguros por razões de precaução. De forma interessante, um ativo pode ser valioso mesmo se ele nunca paga algum dividendo ou juros. Tipicamente, títulos do governo assumem este papel dentro de um país, e ativos de reserva global, tais como um título do Tesouro dos EUA, como o German Bund (título alemão), e os títulos do governo japonês, assumem este papel nas finanças internacionais. Não surpreendentemente, países estão ansiosos em emitir ativos seguros desde que seus baixos retornos requeridos os tornam uma fonte muito barata de financiamento.

Um valor extra de um ativo seguro deriva do fato de que (i) o ativo sustenta seu valor ou mesmo aprecia em tempos de necessidade e (ii) desfruta de alta liquidez de mercado, i.e., pode ser comercializado e re-comercializado a uma margem baixa de oferta. O primeiro é auto-realizado. Em tempos de crise, ativos seguros ganham valor, o que os tornam mais fácil para governos, os quais podem emitir um ativo seguro para financiar várias medidas de estímulo de forma a estabilizar suas economias. Isto, por seu turno, torna o título do governo de um país mais resiliente contra choques macroeconômicos. Ver a dívida governamental como um ativo seguro que toma a forma de possivelmente uma “bolha vacilante” é o elemento chave novo de um arcabouço de política integrada.

Em segundo lugar, quando um ativo pode ser usado como um collateral (garantia), ele afrouxa as restrições de empréstimo do tomador de empréstimo, o que é um serviço adicional do ativo além de suas recompensas. Um título de governo que pode ser usado para relaxar restrições de empréstimos, e.g., porque ele é a garantia mais comum para transações no mercado “repo” (ver newsletter O “Repo Market” (Mercado de Recompra), publicada em 21/08/2022, sobre o mercado “repo”, ou de recompra), é valioso mesmo se a recompensa do fluxo de caixa é negligenciável.

Em terceiro lugar, se um ativo serve como um meio de troca para superar a dupla coincidência de desejos que infesta economias de escambo, ele toma um valor ainda maior (i.e., seu esperado retorno real de fluxo de caixa é mesmo menor). Formalmente isto é modelado em teoria monetária através de restrições de avanço de cash (dinheiro), moeda na função de utilidade etc. Na teoria, muitos ativos e objetos podem ter um papel como meio de troca. Governos encorajam coordenação de um particular paper (título), a moeda doméstica, a qual é referida como narrow money (moeda estrita).

Assumindo-se que as características acima são suficientes para um entendimento básico da importância dos ativos seguros, como se manifesta na prática a dinâmica dos mercados de ativos seguros? Isto pode ser observado a partir da inconstância dos fluxos de capitais internacionais. O financiamento de dívida de curto prazo, por exemplo, é especialmente sujeito a paradas repentinas. Repentinos flights (voos) para safe-heaven currencies (moedas paraísos-seguros) podem causar grandes disrupções e fortes movimentos de moedas, levando em última instância a uma crise.

Quando mercados mudam de “risk-on to a risk-off mood” (de um ânimo arriscado para não arriscado), fluxos de capital entre países são disparados se ativos seguros não são ofertados simetricamente entre países. Economias avançadas, as quais ofertam ativos seguros, experimentam influxos de capital, enquanto a maioria dos países emergentes sofre outfluxos repentinos. Logo, o desenho global de ativos seguros é primordial para criar uma arquitetura financeira global.

Na próxima newsletter daremos continuidade ao entendimento da dinâmica de ativos seguros entre países avançados e emergentes.

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre ativos seguros, não hesite em nos contatar!