A newsletter desta semana trata sobre um importante relatório publicado em janeiro deste ano pelo Asia Society Policy Institute, no seu Center for China Analysis e pela empresa Enodo Economics. O relatório é assinado pela Diana Choyleva, Senior Fellow daquele Centro. Em português o título seria “Petrodólar ao Yuan Digital: China. O Golfo, e o Caminho do Século 21 à Desdolarização”.
O Prefácio do relatório (que transcreveremos aqui para representar um resumo do trabalho) é feito por ninguém menos do que o Prof. Berry Eichengreen, Professor de Economia e Ciência Política da Universidade da Califórnia, em Berkeley, EUA, um dos mais respeitados analistas do mundo em História Econômica e Economia Internacional, autor de livros como The Spread of the Modern Central Bank and Global Cooperation 1919-1939 (editado com Andreas Kakrides), Cambridge University Press, 2024, In Defense of Public Debt (com Asmaa El-Ganainy, Rui Esteves and Kris Mitchener), Oxford University Press, 2021, e How to Achieve Inclusive Growth (editado com Valerie Serra, Asmaa El-Ganainy and Martin Schindler), Oxford University Press, 2021.
No seu Prefácio o Prof. Eichengreen inicia apontando que a desdolarização está no noticiário. O alistamento estadunidense do dólar e do sistema bancário americano quando aplicou sanções contra a Rússia levou outros países, imaginando mesmo a possibilidade remota que eles também possam se tornar sujeitos a tais sanções, a considerar a diversificação para fora do dólar como uma moeda de reserva e para pagamentos. Mais genericamente, o surgimento dos países dos BRICS como uma força econômica e política a ser reconhecida os tem encorajado a contemplar alternativas ao sistema monetário e financeiro internacional baseado no dólar.
Por enquanto o resultado tem sido majoritariamente fala e pouca ação. A fala de uma moeda dos BRICS e de um sistema de pagamentos dos BRICS permanece majoritariamente isso – fala. Como um veículo para pagamentos transfronteiras e pivô de mercados de trocas estrangeiras globais, o dólar está tão profundamente entrincheirado quanto sempre. Segundo dados recentes a participação do dólar nas transações globais aumentou de 29% em 2012 para 49% em 2024 (ver Figura 1 à frente).
Isto não deveria ser surpresa. Os mercados financeiros dos EUA são profundos, líquidos e eficientes pelos padrões das alternativas disponíveis. A Rússia tem os incentivos mais fortes para se mover para fora do dólar, mas os incentivos para outros países são mistos. Os BRICS são uma coleção heterogênea de países com motivos heterogêneos. Alguns são mais próximos do que outros dos EUA. Alguns, tais como China e Índia, estão estremecidos um com o outro.
Ao mesmo tempo, a possibilidade de desdolarização corrente, se gradual, não pode ser desconsiderada. No entanto, há muito mais candidatos plausíveis para guiar o processo do que a “muito discutida”, senão estéril, ideia da moeda dos BRICS. Tal como nos mostra a autora Diana Choyleva neste relatório, o mais consequente desenvolvimento pode ser a substituição, ou mais precisamente, suplementação, do sistema Petrodólar com um sistema Petroyuan centrado na China e na Arábia Saudita.
O sistema Petrodólar, o qual pode ser traçado desde os anos 1970s, tem três elementos: precificação do petróleo em dólares, pagamento por comprar em dólares, e reciclagem de receitas do petróleo em dolar securities (títulos em dólar). Como Diana mostra, China e Arábia Saudita têm um interesse comum em construir um sistema Petroyuan paralelo para as importações de petróleo da China (leia-se exportações de petróleo da Arábia Saudita).
A precificação do petróleo em dólares pode ser difícil para desalojar, mas a China tem razão para preferir pagar por suas importações de energia com sua própria moeda. A Arábia Saudita compartilha deste interesse até o momento, à medida que deseja diversificar para fora do dólar, e pode usar o yuan para pagar pelos serviços das companhias de construção chinesas, e pode comprar títulos nos mercados financeiros da China.
Mais importante, os dois países têm um mecanismo financeiro no lugar para competir com estas transações de forma segura e rapidamente sem a necessidade de ir através do dólar e do sistema bancário dos EUA. Este é o protocolo Dashing (mecanismo de consenso) baseado em blockchain e desenvolvido pelo PBoC para o Projeto mBridge, uma vez- mas não mais coordenada pelo BIS – Bank for International Settlements, plataforma transfronteira de pagamentos em que os bancos centrais chinês e saudita são ambos participantes integrais. O protocolo Dashing está agora sendo empregado para além do Projeto mBridge. Ele tem voado largamente sob radar. Mas não tão longe, agora que nós temos este importante relatório.
Finalmente, como ressalta o Prof. Eichengreen, tal como apontado por Diana, o que acontece na Arábia Saudita é improvável de permanecer na Arábia Saudita. Outros países, especificamente no golfo, provavelmente seguirão seu exemplo. Tal como também aponta Diana, o sistema Petroyuan é improvável de suplantar o sistema Petrodólar tão breve. Até agora, este importante nexo de questões tem sido estranhamente negligenciado. E, para concluir, o Professor assinala que Diana Choyleva agora corrigiu tal negligência!
Em resumo, convidamos nossos leitores a mergulharem neste importante relatório, com dez capítulos, que tenta retratar uma possível nova arquitetura do sistema financeiro internacional com players efetivos e com interesses reais na transformação da economia global.
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre os sistemas Petrodólar e Petroyuan, não hesite em nos contatar!
Figura 1 – Participação dos Pagamentos Internacionais via SWIFT por moeda
